Ele já entrou fazendo barulho. Tropeçou na cadeira logo da entrada e foi gritando que “era dia de beber”. Eu nunca tinha o visto daquele jeito. Com vontade de encher os córneos e entornar todas, sim, mas não com aquele rancor sendo colocado pra fora. Aquela coisa ruim que o fazia soluçar na própria raiva e desejar beber por beber, pra cair, pra apagar. Pra não viver.
Conseguiu se arrastar com muito custo até a mesa perto do palco. O cantor da noite não se assustou e depois me confidenciou que já tinha visto cenas parecidas, mas aquela era demais. O pedido veio, a garrafa de cerveja cruzou o salão e logo se esvaziou no copo frenético que mal encostava na toalha. A cada gole, um brinde aos presentes.
Estava ficando chato.
O sirvo há mais de ano. O motivo do primeiro porre era o mesmo de agora, mas algo ainda não contado parecia agravar a situação. Em determinada hora, o volume da música cantada por ele se intensificou e pude vê-lo chorando. Não sei se existe coisa pior no mundo do que sofrer por amor, mas ele estabelecia novos limites para mim.
Aconselhado por meu patrão, cheguei-me junto ao homem e perguntei o que tinha havido. Obviamente que era mulher. Talvez a mesma que, numa noite perdida, o fez encontrar o caminho do meu bar e sentar-se à mesa solitário, apenas querendo esquecer que respirava. Ele soluçou e disse:
– Eu sei que eu tô enchendo o saco, mas todo bebum fica chato. E, mais do que nunca, hoje eu tenho razão! Ela vai se casar. Hoje! E, pra completar, me mandou uma carta…
– E o que diz a carta!? – perguntei logo, tentando compreender melhor a dor do sujeito.
Em vão.
Depois de mais alguns grunhidos chorosos e três soluços, ele deixou o copo cair na mesa molhando a toalha e o chão, encostou a cabeça no braço apoiado e dormiu. Não importa o que dizia o pedaço de papel, mas aquele coração estava em pedaços.
A mesa de bar não curaria, não colaria, nem faria esquecer, mas, ainda assim, tornaria tudo embaçado e daria um sono de recompensa a quem tentava fugir com tanta pressa da realidade.
Deitado no chão por mim e outro colega, acordou apenas no dia seguinte com uma ressaca violenta.
Pior do que a de cerveja ou de cachaça.
Ressaqueado no coração.
(Gustavo Lacombe)